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Linguagem Neutra: Quais os motivos de haver dois lados?

 Durante os últimos anos, está decorrendo pela internet a discussão sobre se e como a linguagem neutra deveria ser usada no nosso cotidiano e para além disso, incluí-la na língua portuguesa. A repercussão se elevou ao ponto da questão sair dos ‘trend topics’ para ir para debates entre linguistas renomados e até mesmo políticos.

 Mas antes de falar sobre o posicionamento de cada um, temos que entender o que é a linguagem neutra.

 Essa sugestão na mudança da fala brasileira interveio como uma forma de reflexão sobre representatividade com o objetivo de tornar a nossa língua mais inclusiva para com as pessoas de dentro da comunidade LGBTQI+ das quais não se identificam dentro da binaridade de gênero.

  A linguagem neutra traz a quebra do caráter sexista e acaba com o “falso neutro”, como é chamado o masculino genérico, onde cabe uma forma de marcar a hierarquização de gêneros na sociedade, priorizando o homem e invisibilizando mulheres.

 Como o tópico foi levantado tempos atrás, já surgiram formas de como utilizarmos. As primeiras propostas foram trocar "o" e "a", que em português são vogais-morfemas que definem o gênero das palavras, para "x" ou "@", porém estes caíram em desuso por causar dificuldade na leitura para pessoas disléxicas e por não existir uma pronúncia correta. Ultimamente é mais comum utilizar a letra “e” para substituir a vogal temática e o artigo. Assim a palavra “estudioso”, por exemplo, ficaria “estudiose”, sem implicar nenhum gênero naquele ao que se refere.

 Linguistas se dispõem a rever as complicações que poderiam haver ao aderir o pronome, se mostrando apoiadores da causa. “É interessante entendermos isso como um movimento social e de transformação. A sociedade está sempre em transformação. Há discursos conservadores que acham que as coisas são fixas, mas não é assim e nunca foi.” diz Heloisa Buarque de Almeida, professora do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre os Marcadores Sociais da Diferença (Numas)

 Vivian Cintra, professora de língua portuguesa, coordenadora pedagógica e mestre em Linguística pela USP, lembra a  influência que a cultura e a época tem sobre a língua, explicando o porquê o uso do masculino genérico fazia sentido antigamente e hoje em dia pode ser incômodo, sendo assim um motivo para ser considerado inadequado.

 "Em uma sociedade patriarcal, fazer questão de utilizar o feminino para dar visibilidade, discursivamente, a mulheres, configura uma forma de resistência para elas. Talvez, para as pessoas que têm a preocupação de usar formas mais neutras para se expressar, manter-se empregando o masculino genérico seja uma postura de aceitação da dominação masculina na nossa sociedade ou da lógica binária segundo a qual homens só podem se expressar no masculino, e mulheres, no feminino." termina a sua explicação.

 Apesar do objetivo de progredir e incluir, muitas pessoas se mostraram contra ao que seria uma nova norma.

 O deputado estadual Pastor Cleiton Collins (PP) publicou um projeto de lei que prevê a proibição do uso das novas formas de flexão de gênero nas instituições de ensino públicas ou privadas de Pernambuco, além de bancas examinadoras de seleções e concursos públicos no Estado. Um dia antes, sua mulher e também vereadora da cidade de Recife, Michele Collins (PP), tinha publicado uma PL parecida que antecipava uma multa de no mínimo R$ 1 mil para os estabelecimentos de ensino que descumprissem a ordem.

 O pastor afirmou que a linguagem neutra é uma ameaça à língua portuguesa e que a utilização da flexibilização do gênero não-binário é uma prática de grupos extremistas para anulas as diferenças.

 “A linguagem neutra é toda e qualquer forma de modificação do uso da norma culta da Língua Portuguesa e seu conjunto de padrões linguísticos, de modo a serem escritos ou pronunciados com a premissa defendida pelos grupos extremistas de anular as diferenças de pronomes de tratamento de masculinos e femininos baseando-se em infinitas possibilidades de gêneros não existentes” concluiu o parlamentar.

 Outra que se posicionou contra foi a professora de português Cíntia Chagas que participou do programa Opinião No Ar, da RedeTV!, na última sexta-feira (19), dizendo que era desnecessário e que para ela o uso da linguagem neutra é um desrespeito à língua portuguesa.

 “Tem a ver com o politicamente correto. Primeiramente tentam dominar a forma como falamos, depois a forma como nós pensamos e, por fim, a forma como nós agimos” afirmou a professora quando questionada sobre o surgimento da linguagem.

 Tentando explicar a linguagem neutra e seu uso, Rosa Laura, uma pessoa não-binária e ativista da causa trans, publicou em setembro um vídeo em seu instagram dizendo o porquê deveríamos utiliza-la e até mesmo citou alguns exemplos de palavras e frases no neutro, compartilhando também um manual para consulta se alguém tivesse mais dúvidas.

 Seu vídeo acabou viralizando, só que contradizendo o que Rosa esperava, extremistas passaram a fazer discursos de ódio e inclusive um famoso programa da rádio divulgou partes do vídeo, num show de chacota, humilhação e transfobia.

Fontes

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